A ocorrência da síndrome de burnout em médicos e enfermeiros é bastante comum e com a pandemia do covid isso disparou.
Se você é médico e está aí meio perdido sobre os seus direitos, vou te mostrar as principais causas laborais da burnout, quando ela pode ser considerada uma doença ocupacional e quais são os seus direitos.
Espero que as informações te ajudem a entender um pouco mais sobre o que você tem direito e o que pode fazer.
Principais causas da síndrome de burnout em médicos
Médicos e enfermeiros estão entre os profissionais mais vulneráveis à síndrome de burnout, afinal vocês lidam com grande estresse diariamente.
Claro, todo mundo lida com estresse todos os dias, o estresse faz parte da nossa vida. Entretanto, no caso de vocês da saúde isso é bem mais intenso.
A frequência da burnout em médicos e suas causas variam bastante de acordo com a especialidade.
Em uma revisão realizada por meio das bases de dados LILACS, MEDLINE, PubMed e SciELO, incluindo trabalhos que usam o Maslach Burnout Inventory, foi identificado que os que mais sofrem com burnout são os médicos de UTI, seguidos pelos de atendimento à família e emergência.
Veja o gráfico:
Compilando as principais causas identificadas, nas mais diversas especialidades, as principais causas de síndrome de burnout em médicos são:
- Não ter um contrato fixo de trabalho;
- Falta de recursos, como a escassez de instrumentos na atenção primária;
- Falta de apoio dos cargos superiores;
- Alta carga de trabalho ou turnos extras;
- Insatisfação com a carreira e o salário;
- Assistir doentes graves e ter que tomar decisões complexas como a de suspender o tratamento e proceder à sedação terminal;
- Comunicação institucional inadequada;
- Excesso de comunicação burocrática e organização multidisciplinar do trabalho;
- Impacto negativo do stress ocupacional sobre a vida familiar e a falta de estímulo intelectual do trabalho;
- Pouco tempo para recreação depois de dias de alta demanda de trabalho, associado à fadiga;
- Exigências laborais físicas e psicológicas, muitas vezes com privação do sono, repercutindo na necessidade/dependência de medicamentos psicotrópicos.
Existem outros riscos psicossociais relacionados ao surgimento do burnout, como o assédio moral e sexual.
Essas causas são apenas exemplos, mas o ideal é que seja analisado em cada caso, o que levou ao burnout, até mesmo para estabelecer o nexo causal entre a doença e o labor.
Quando a síndrome de burnout em médicos é considerada doença ocupacional?

Diferente do que muita gente acha, não basta ter a síndrome de burnout para ter direito a indenização, estabilidade e outros direitos.
Para que a burnout seja reconhecida como uma doença ocupacional, ela precisa estar diretamente relacionada ao trabalho.
Você só terá todos os direitos de quem sofre um acidente de trabalho ou adquire doença ocupacional quando a burnout tiver sido causada pelo trabalho.
Isso pode parecer algo muito simples e óbvio, mas não é.
Como a burnout é uma síndrome multifatorial, nunca haverá apenas uma causa, mas vários fatores que levaram ao adoecimento. A pergunta que deve ser feita é:
O principal fator está relacionado ao trabalho?
Veja dois exemplos:
Exemplo 1
Tiago trabalha dando 8 plantões por mês em Fortaleza/CE, 2 plantões em Maracanaú/CE e 6 plantões em Natal/RN.
Depois de 1 ano nessa rotina, ele resolveu investir em um negócio e abriu um hostel em Fortaleza.
Além das mais de 190 horas de trabalho, Tiago tem que tomar várias decisões dentro do hostel, mesmo com um colega administrando o empreendimento.
Durante a pandemia do covid, pela falta de médicos e excesso de atendimentos, Tiago precisou fazer mais 2 plantões por mês em Fortaleza.
Ainda por causa da pandemia, o hostel de Tiago passou a ter menos clientes e ele precisou demitir vários funcionários e por pouco não faliu.
Diante de toda essa situação, o corpo não aguentou, veio um quadro de síndrome de burnout, que se desenvolveu em uma depressão grave.
Nesse caso, será que é possível relacionar a depressão e a burnout como sendo causada pelo trabalho?
Será que o trabalho foi um fator decisivo para que o médico adoecesse?
Talvez até seja possível relacionar com o aumento da carga de trabalho em Fortaleza e o acúmulo de 4 trabalhos diferentes.
Entretanto, seria delicado culpar algum dos hospitais pelo adoecimento.
Exemplo 2:
Luciana é uma cirurgiã e trabalha em um Hospital de Recife/PE.
A rotina de trabalho de Luciana é bem “tranquila”, ela faz 4 plantões em uma semana e folga na semana seguinte.
Ela sempre está viajando, saindo com as amigas e aproveitando o tempo livre.
Acontece que o antigo chefe de Luciana foi transferido para outro Hospital e entrou uma nova coordenadora, que era conhecida por ser uma chefe bastante carrasca.
Em um plantão, Luciana acabou tendo uma discussão com a sua coordenadora, que queria que Luciana desviasse de um procedimento padrão do hospital.
Depois disso, a vida de Luciana virou um inferno.
A sua coordenadora passou a sobrecarregar Luciana, impedia que ela tirasse férias e ficava sempre procurando erros.
Isso tudo fez com que Luciana ficasse sempre hipervigilante e se sentindo incompetente, sempre com medo de errar e acabar perdendo seu emprego.
Por causa disso, Luciana acabou desenvolvendo síndrome de burnout e posteriormente transtorno de estresse pós-traumático.
Nesse caso é possível identificar uma situação bastante clara que levou ao adoecimento, que foi a nova chefia.
Há riscos psicossociais claros no ambiente de trabalho que possivelmente levaram ao adoecimento, logo, é possível reconhecer o adoecimento como sendo relacionado ao trabalho.
Quer entender melhor quando a síndrome de burnout é considerada doença ocupacional? Basta conferir este post.
Quais são os direitos dos médicos com síndrome de burnout?
Quando a síndrome de burnout está relacionada ao trabalho, você terá os seguintes direitos:
- Afastamento pelo INSS, recebendo auxílio-doença acidentário (código 91);
- Estabilidade de 12 meses;
- Indenização pelos danos morais;
- Reembolso pelas despesas médicas;
- Aposentadoria por invalidez e pensão, no caso de incapacidade permanente.
Claro que para ter todos esses direitos, existem requisitos mais específicos.
Vamos entender um pouco mais sobre cada um deles?
Afastamento pelo INSS
Afastamento por síndrome de burnout: cuide de si antes que seja tarde demais! 2023
O primeiro direito que você deve conhecer é o de se afastar pelo INSS, enquanto estiver sem condições de trabalhar.
Para ter esse direito, você precisa estar sem condições de trabalhar por mais de 15 dias, e precisa ter um atestado médico confirmando isso.
Além disso, você precisará passar por uma perícia, com um médico do INSS.
Dependendo se a síndrome de burnout é ou não relacionada ao trabalho, você terá direito ao auxílio-doença comum (código 31) ou acidentário (código 91).
No caso de estar relacionada ao trabalho, você também tem o direito de ter emitida a CAT.
Isso não é apenas seu direito, como obrigação da empresa, por isso, exija isso.
Caso a empresa se recuse a emitir a CAT, você pode solicitar ao seu Sindicato, ou você mesmo emitir (sim, é possível).
A CAT vai te ajudar a ter reconhecido o benefício 91, por isso a sua importância.
Como posso me afastar pelo INSS?
O primeiro passo é ter um atestado médico te afastando do trabalho por mais de 15 dias.
Depois, basta agendar uma perícia pelo meu inss ou através do número 135.
Geralmente as próprias empresas ajudam os funcionários com esse agendamento da perícia, então basta entregar o atestado para o RH e solicitar o encaminhamento.
No dia da perícia, você deverá levar toda a sua documentação médica (atestados, laudos, relatórios e receitas).
Não leve remédios ou caixas de remédio, elas não vão te ajudar e os peritos odeiam quando isso acontece.
Quanto tempo posso ficar afastado por síndrome de burnout?
Não existe um prazo máximo para que você fique afastado por síndrome de burnout.
Enquanto você estiver sem condições de trabalhar, terá direito a ficar afastado pelo INSS.
Claro, não adianta apenas dizer que está afastado, você precisa ter um atestado médico confirmando que não está em condições de trabalhar e também vai precisar passar pela perícia do INSS.
O INSS não reconheceu meu benefício, ou reconheceu com código 31, e agora?
Você pode recorrer, no próprio meu INSS, contra a decisão que não reconheceu o benefício 91, ou mesmo contra a decisão que não reconheceu benefício nenhum.
Geralmente os recursos não são muito efetivos e na maioria das vezes o INSS acaba mantendo a decisão anterior, mas vale a tentativa.
Caso o INSS não mude a decisão, dependendo do caso, você também pode recorrer à Justiça federal, através de um processo judicial contra o INSS.
Para isso, você vai precisar de um advogado previdenciarista.
Estabilidade de 12 meses
Quando a sua síndrome de burnout é reconhecida como uma doença ocupacional, você tem direito a estabilidade de 12 meses.
Segundo a súmula 378 do Tribunal Superior do Trabalho, existem 2 requisitos:
- Ter se afastado do trabalho por mais de 15 dias;
- Ter recebido o auxílio-doença acidentário (código 91).
Essa é a regra geral…
Allan, então se eu não tiver me afastado pelo INSS ou não tiver recebido o benefício 91, não vou ter estabilidade?
Calma, o próprio TST reconhece uma exceção:
Quando você tem reconhecida, na Justiça do Trabalho, que está com uma doença ocupacional.
Vamos supor que você começou seu tratamento de burnout, não chegou nem a se afastar pelo INSS, e já foi logo demitido.
Você vai precisar entrar com uma Ação Trabalhista contra a empresa e lá, se for reconhecido que você está com alguma doença relacionada ao trabalho, poderá exigir a reintegração ou uma indenização de 12 meses de salário.
Se você foi demitido com burnout, recomendo ler o nosso passo a passo explicando o que precisa fazer e quais seus direitos.
Indenização pelos danos morais
Se você adquiriu síndrome de burnout por culpa da empresa/hospital, nada mais justo do que receber uma indenização.
O objetivo dessa indenização por danos morais é justamente reparar o seu sofrimento.
A gente sabe que não dá pra trazer de volta o sofrimento todo causado, mas o legislador trouxe essa forma de reparação financeira.
Dependendo da gravidade da situação e da culpa da empresa, o valor será menor ou maior.
Se você quer entender mais sobre a indenização por danos morais, recomendo ler estes posts:
- Quando a síndrome de burnout gera indenização? 2022
- Como receber indenização por síndrome de burnout em 2022?
- Qual o valor da indenização por síndrome de burnout em 2022?
Aqui, o que você precisa saber é que é possível exigir uma indenização sempre que adquirir a síndrome de burnout por culpa da empresa.
Indenização pelos danos materiais
Uma simples gripe ou resfriado já traz prejuízos financeiros, remédios que a gente precisa comprar, uma consulta médica…
Com a síndrome de burnout não é diferente, você terá gastos com medicação, que geralmente é bem salgado, além de consultas com psicólogos e psiquiatras.
Durante o tratamento, você acaba tendo que gastar mais de R$1.000,00 por mês apenas com remédios, o que significa que você terá um grande prejuízo financeiro.
Ora, se você adoeceu por causa da empresa, ela deve responder por esse prejuízo.
Por isso, você tem direito de exigir o reembolso por todas as despesas com o seu tratamento.
Para isso, é importante que você tenha como provar as despesas que teve. Você pode fazer isso apresentando os recibos e notas fiscais.
Aposentadoria por invalidez e pensão
Não é raro ver casos de pessoas que tiveram que se aposentar por causa de uma depressão ou outro transtorno mental que começou com uma síndrome de burnout.
Caso você fique sem condições de trabalhar de maneira permanente, para o resto da vida, é possível tanto receber uma aposentadoria por invalidez, como uma pensão da empresa.
Para ter direito à pensão pela empresa, a síndrome de burnout deve ter sido culpa dela.
Essa pensão também é um tipo de indenização por danos materiais.
O objetivo é compensar pelo salário que você vai deixar de receber, por causa da incapacidade permanente.
Assim, se você tinha um salário de R$30 mil, a empresa deve garantir a sua remuneração até o fim da vida, já que ela é responsável por sua incapacidade.
Está com burnout e precisa de ajuda?
Sabemos pelo que você está passando. Somos um Escritório com vasta experiência em causas envolvendo síndrome de burnout e podemos te ajudar a encontrar uma saída.
Conclusão
Você viu aqui as principais causas da síndrome de burnout em médicos, além dos direitos daqueles que estão sofrendo com a burnout.
Se eu puder te dar uma última dica, que eu entendo ser muito valiosa, é para que você documente todo o seu tratamento.
Guarde o máximo de provas do que te levou ao burnout e as consequências disso na sua vida.
Muita gente acaba esperando a situação ficar totalmente insustentável para começar a guardar provas, e acaba se prejudicando.
Espero que este artigo tenha te ajudado nesse momento tão difícil.
Temos alguns outros posts sobre a síndrome de burnout que podem te ajudar, se quiser conferir todos, basta clicar aqui.
Um abraço e até a próxima!
